terça-feira, setembro 01, 2009

o identificador de chamadas.

ela não tirava o olho do identificador de chamadas do telefone da sala de casa.
foi pela sala que ela chegou e pela sala ela ficou as próximas vinte e sete horas. ela e o telefone.
ao seu lado uma sacola de compras da c&a ainda com todas as roupas dentro.
a sua frente, além do telefone, uma garrafa de martini bianco e um copo desses que vem de brinde ao comprar a garrafa-- cheio.
o sexto cigarro queimava na direção do indicador e do dedo médio dela quando o telefone tocou. pelo identificador ela viu que era o seu pai. não era ele. a pessoa que ela havia conhecido no bar, no happy hour do dia anterior. o identificador de chamadas não mente. disso ela tinha certeza. e foi ali, ao lado do telefone que ela acordou na manhã seguinte. com a mesma roupa do dia anterior, um maço vazio e um gosto de nada na boca. quando o relógio marcou oito, ela levantou-se e foi para o trabalho.

ela não contava para ninguém, mas estava viciada no identificador de chamadas. é, não era a voz do outro lado que ela aguardava ansiosa. mas a luz azul piscante com o número de alguém que ela havia conhecido recentemente. a luz piscante com número do pai, do irmão, essa não tinha graça. mas a luz piscante com número de um sujeito que ela conheceu em algum lugar e ela-- mesmo se fazendo de difícil, conseguiu que o cara ligasse-- isso deixava ela completamente louca. ela também nunca contou para ninguém que a razão pela qual seus relacionamentos eram breves, era exatamente essa. o identificador de chamadas. quando um sujeito se transformava em namorado, o número estava decorado, e ansiedade e emoção do indentificador de chamadas se diluia.

hoje um pessoal do trabalho convidou ela para sair. ela disse que tinha um compromisso. passou no mercado, comprou milho para pipoca. fez a pipoca, vestiu algo confortável e passou a noite assistindo a luz do identificador de chamada piscando. as vezes com emoção. as vezes não. o seu programa favorito.

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