domingo, janeiro 31, 2010

ele tinha um caso com a melhor amiga da namorada dele.

ela pára o beijo e comenta baixinho-- segurando o queixo dele com o indicador e o polegar:

- quando você beija, você coloca muito a língua.
- mas não é assim que se faz?
- eu prefiro mais delicado.
- sem língua?
- com pouca.
- assim?
- [silêncio]
- [silêncio]
- menos.
- assim?
- assim.
- é, assim não é ruim.
- não.
- é mesmo melhor. muito melhor.
- mas... um favor..
- o que?
- só não esquece de como se beija da outra maneira.
- mas... você não gosta.
- mas a sua namorada, sim.

caprichou tanto mas tanto na protagonista do próprio livro, que não conseguia imaginar dividir ela com mais ninguém.

-fim-

e depois que ele terminou a última linha do romance, entrou em profunda depressão.
afinal, nunca mais iria digitar as características de maria, a heroína do seu livro.
por falar nisso, nunca mais digitaria o nome dela seguido de exclamações, interrogações, vírgulas e pontos finais.

ele ficou olhando para o calhamaço com as quatrocentas e tal páginas, deu um gole farto no vinho tinto e lançou a única cópia do livro na lareira. ele iria recomeçar a escrever o livro. tudo de novo. pois só assim para imaginar sua heroína novamente. essa era a única maneira de conviver com ela por mais algum tempo. antes de dividir a mulher mais perfeita que jamais imaginou-- com milhares de leitores.

sua editora teria que esperar mais um pouco. aquela era a quarta vez que ele reiniciava o mesmo livro-- na máquina de escrever que herdara do pai.

segunda-feira, janeiro 25, 2010

a coluna de despedida do destak.

uma das coisas mais bacanas que aconteceram desde que eu cheguei a lisboa foi a coluna semanal que eu escrevia no destak. escrevia, assim mesmo no passado, pois já não escrevo mais. foram quase três anos de colunas. mais de 100 se não me engano. cada uma com uma dica nova ou observação de um lugar no mínimo curioso. as vezes era um restaurante desconhecido. as vezes um restaurante conhecido, mas que eu tentava de alguma maneira descobrir um prato novo. muitas vezes a coluna era sobre uma cidade longe de tudo, as vezes sobre uma cidade perto, mas que por algum motivo não tinha lá o protagonismo merecido num guia de viagens.

bom, a coluna também foi uma maneira de conhecer a cidade de uma maneira interessante. pois me forçava a prestar mais atenção nas coisas. com a coluna passei a gostar ainda mais de lisboa. e ficava feliz sempre que algum lugar mencionado na coluna ganhava um pouquinho mais de atencão do público.

enfim, essa foi a coluna de despedida. saiu no finalzinho de dezembro do ano passado.
acho que tem uma ou outra que eu não consegui colocar aqui no blog. mas assim que der, eu faço o update.

sábado, janeiro 23, 2010

a nova geração. ou "o namoro 2.0 também tem que funcionar! caráio!!"-- pensou ela.

ela acaba o namoro com ele e como primeiro motivo diz:
- você parou de me seguir no twitter.
e ele responde de bate pronto:
- você nunca seguiu o meu blog.
e ela com um dedo apontado para a tela do macbook que está sobre o criado mudo diz:
- você nunca me chama para conversar no msn.
ao ouvir isto ele responde como quem já tivesse uma resposta na ponta da língua:
- e você sempre responde as minhas mensagens de 'sms' com "tb!", "Ok!", "Bj!"
ela grita:
- "também!" , "OK! e "beijo!", porra. você não sabe?! e você que nunca deixou comentários no meu flickr!!
ele respira fundo e resmunga:
- no facebook, você nunca tag uma foto minha!!! nenhuma foto em que estou ao seu lado!
e ela:
- nunca chegou o seu invitation para eu entrar no seu LinkedIN!!!??

ficaram em silêncio. e cada um seguiu para um lado. acabaram um namoro de 4 anos em que se comunicavam com perfeição-- porque não faziam o mesmo no mundo virtual.

"eu quero!! é meu!!"

os irmãos eram unidos.
seis. sempre os seis.
faziam tudo juntos.
sempre.
os meninos e as meninas.
um defendia sempre o outro.
o bairro todo conhecia aquela família.
na escola também. cada um, um ano na frente do outro.
uma escadinha perfeita.

até o dia que o pai trouxe uma caixa de bombons sortidos "garoto" para casa.
na caixa só vinham 4 "sonhos de valsa". apenas 4!

sintomas da noite anterior.

enquanto cata a remela do olho direito com o indicador, ele cutuca o ombro dela (que está de costas para ele na cama) -- com a mão esquerda e pergunta, baixinho:

- ana?
- maria.
- descul.. maria?
- oi?
- abro a cortina ou quer passar o sábado assim, sem saber ao certo as horas, o tempo lá fora...
- deixa assim. eu não gostaria que você me visse assim, já sem maquiagem, o vestido, enfim, aquela produção toda que eu estava ontem a noite quando nos encontramos.
- você tem razão. eu também não gostaria que você me visse assim, já sem a vodka tonic, as três taças de champagne, enfim, aquela combinação toda que você estava e ajudou na percepção que você teve de mim, ao me ver naquela festa.
- cortinas fechadas.
- cortinas fechadas.

domingo, janeiro 17, 2010

a conversa.

- pai?
- oi?
- de onde viemos?
- sério meu filhinho? você quer ter essa conversa hoje?
- mas, mas existe dia certo para perguntar isso?
- porra meu filho, puta conversa complicada. acabei de sair de uma reunião, olha o trânsito como está horrível. estou com uma dor de cabeça e a espera de uma ligação de um cliente. será que dá para segurar esse papo uns dias?
- só se você prometer...
- o que?
- contar a versão que envolve sacanagem.
- oi?

sexta-feira, janeiro 15, 2010

a caixa completa.

depois de três dias resistindo-- ele finalmente ia ceder a tentação-- e iria ligar para a ex-namorada. a mesma que ele chamou de filha da puta repetidamente depois de descobrir que ela havia traído ele com o amigo da aula de ciências exatas da faculdade.
era a sexta vez que esta cena se repetia. ela sempre destroçava o coração dele e ele voltava.

ele pegou o telefone e com três botões-- chegou no nome dela. e quando ia apertar o quarto botão, o do 'ok'-- o amigo que observava aquele acidente de perto-- largou tudo e agarrou o telefone celular da mão dele. o amigo fechou um dos olhos como se o sol estivesse incomodando a vista e disse com uma certa decisão:

- por favor-- pensa duas vezes antes de ligar.
- mas...
- cara, ela é uma filha da puta. não faça isso.
- mas é que...
- eu sei, você ama ela.. mas é sempre a mesma coisa. eu não quero ver você sofrendo. porra cara, a minha mulher diz que as amigas dela têm pena de você.
- mas você não sabe que...
- não liga.. não liga...
- mas pô você não me deixa...
- o que? não deixo o que? não deixo você tentar me convencer que ela não é uma vagabunda?
- caralho!!! porra me escuta!!!
- vai, diz seu bosta.
- ela... ela... ficou com a minha caixa completa... com todas as temporadas do seinfeld.
- a caixa completa? liga para essa filha da puta!

quarta-feira, janeiro 13, 2010

"não tenho certeza, mas acho que o seu filho viu tudo."



- mãe?
- oi?
- qual é o nome daquele moço que estava no seu quarto mesmo?
- ninguém. filhinho.
- vou falar sobre esse assunto com o papai então.

(silencio)
(silencio)

- filho?
- oi?
- qual é o nome daquele videogame que você queria ter para o seu quarto mesmo?
- um  xbox. mamãe.
- vou falar sobre esse assunto com o seu pai então.

ela não conseguia parar de pensar naquilo. e por isso não conseguia mais pensar nele.



duas amigas conversam baixinho num café. não chove lá fora. mas, mais tarde a previsão promete chover para caráio. o diálogo das duas que segue é testemunhado por uma garçonete-- assim mesmo-- já pela metade enquanto ela (a garçonete) serve leite quase quente sobre um café quase frio para a mulher que faz a primeira pergunta.

- mas você ama ele?
- amo.
- então qual é o problema?
- ouvido.
- ouvido?
- sim, o ouvido dele.
- o que tem o ouvido dele?
- tem um tufo de cabelo escuro e denso lá no meio.
- porque você não diz isso pra ele.
- vergonha. Você sabe como eu sou tímida.
- ué, fala baixinho no ouvido dele.
- mas tem um tufo de cabelo escuro e denso lá no meio.
- (silêncio)
- (silencio)
- é, um tufo é um tufo.
- meio desgrenhado... sabe?

e a garçonete termina de servir o leite, se afasta da mesa e nunca conseguiu descobrir o desfecho daquele drama que assolava aquela mulher. o tufo. qual era o o tamanho exato dele? dava para ver de longe? ou apenas de perto? o namorado dela sabia que ele tinha um tufo? ela ia acabar com ele por causa de um tufo? bom, a mesa ao pé do balcão chamava ela.

sexta-feira, janeiro 08, 2010

Proibido e por isso mais interessante. Era o plano dele. E funcionava sempre.


- oi?
- oi.
- você é nova no prédio?
- Me mudei ontem. E você?
- moro aqui desde 1987. Mas amanhā vou começar a procurar um apartamento novo.
- porque? Algum problema com o prédio?
- nenhum.
- então porque você vai se mudar depois de tanto tempo?
- porque você se mudou para cá.
- mas o que...
- linda. Você é muito...
- obrigada. Mas...
- casado. Eu sou casado.
- ok, mas...
- eu nunca tive uma vizinha que fosse tão gostosa quanto você. E pior. Vizinha de porta.
- mas quem disse que eu vou querer alguma coisa com você?
- minha mulher.
- mas eu não vou.
-mas para ela não importa.
- mas para mim sim.
- se ela cismar que estamos tendo um caso então nós estamos tendo um caso.
- e não tem o que você pode dizer que...
- ela vai ter sempre a certeza que eu estou tendo um caso com você.
- mas...
- linda. Você é muito linda. Conheço ela. Se eu me mexer muito na cama vai achar que estou pensando em você.
- mas ela sempre foi assim?
- é a situação. Na porta ao lado. O seu biotipo.
- o que tem o meu biotipo?
- é perfeito.
- e tem o ciúmes dela?
- o que tem...
- é doente.
- sempre?
- não. Casos especiais.
- e eu...
- você é o mais especial.
- (silêncio)
- (silêncio)
- então se é inevitável...
- inevitável.
- Cadê ela agora?
- trabalho.
- você...
- o que?
- quer conhecer o meu apartamento?
- você está me convidando para...
- rápido. Antes que ela chegue.

sim.



com a boca ainda cheia do pão do couvert ele dá um gole grande no vinho da casa.
ele coça o nariz e pergunta para ela-- ainda de boca cheia e com um olho no jogo que passava no LCD do restaurante:

- você quer casar comigo?
- (silencio)
- (silencio)
- (silencio)
- (silencio)
- não.
- mas porque não?
- porque não.
- mas achava que você queria tanto.
- sim, mas esperei muito tempo.
- seis anos?
- sete. não, quase oito.
- então é "não", "não" é a sua resposta final?
- sim.
- mas você não está fazendo isso para se vingar de mim, não né?
- um pouco.
- mas a gente vai continuar namorando?
- talvez.
- talvez?
- sim, talvez.
- mas como é que eu vou ficar com você assim com essa indecisão toda?
- viu como é ruim?