terça-feira, dezembro 28, 2004

o garçom.

[restaurante cheio na oscar freire. 22:17. 20-30 minutos de espera.]

- eu vou querer o filé.
- e como é que você vai querer?
- ao ponto. não. ao ponto pra bem passado.
- e pra beber?
- coca. sem gelo e com duas rodelas de limão.
- mais alguma coisa?
- o molho da salada...à parte.
- mais alguma...
- os tomates...os tomates eu quero picados, não fatiados.
- ok. tudo anotado. já vou trazer o couvert da senhora. só uma coisa...
- o quê?
- você prefere que eu cuspa sobre o bife--ou sobre a salada?

o acordo.

dieta é foda. é chato. é anti-social. chegar num restaurante e pedir que troquem as batatas crocantes com catupiry que acompanham o frango--por salada verde é sacanagem. tirar miolo de pão francês. passar manteiga branca sem gosto. recusar gentilmente o cardápio de sobremesas. acho que todo mundo deveria parar com isso. chegar num acordo. um acordo simples. nele, todos concordariam em usar calças de moleton. daquelas largas. que sobram nos joelhos. um país inteiro usando calça de moleton. todo mundo igual. sem essa viadice de contar calorias. pense no armário novo. socado de calças de moleton de ponta a ponta. calça de moleton é confortável. barata e combina com tudo. imagine chegando num bar. pedir uma porção de fritas. caprichada. bolinhos bacalhau. chopp(s). porção de parmesão e pastel de nata de sobremesa. sem culpa. vc vai estar de calça de moleton. maravilha. sem dramas. com elástico. e cordinha para ajustar.

esse acordo, porém--teria uma cláusula: ele teria validade para todo mundo--menos para a giselle.

quarta-feira, dezembro 22, 2004

a bundinha do queixo. (ou "um mini-diálogo entre mãe e filho")

[seis da tarde, quase sete. mãe e filho na cozinha dividem um pote de requeijão e um pacote de bolacha água e sal. ao fundo passa o SPTV segunda edição na televisão semp-toshiba 19” da sala. mariana godoy apresenta com um terninho vermelho e 300ml de laquê no cabelo. já a mãe está de vestido florido, possivelmente costurado pela vizinha. filho está de bermudão bege quase branco, camisa quase oficial do mengão nº7 . debaixo da mesa, ele brinca com um par de havaianas daquelas brancas-- com bandeirinha do brasil. ele boceja, dá um gole generoso num café com leite que já não está mais morno, olha para a mãe e esboça um assunto. ela ajeita os bifocais, joga aquela correntinha sem-vergonha que mantém os óculos no pescoço pra trás e presta atenção na palavra que escorrega da boca do filho. tudo indica que ele fala assim de propósito. só para fazer ela apertar a vista-- e cultivar mais as rugas.]


- mãe?
- o que foi meu filho?
- você acha mesmo que eu sou parecido com o papai?
- [silêncio]
- mãe?
- eu escutei meu filho.
- então...
- eu não entendi a pergunta?
- você acha que eu sou...
- não, não é isso...eu entendi as palavras... não entendi o que você quis dizer com elas...
- é que...
- é que o que meu filho?
- meu queixo tem uma bundinha.
- como?
- bundinha, meu queixo tem uma bundinha. vai dizer que você nunca percebeu?
- bundinha. bundinha no seu queixo. sei... mas o que isso tem a ver com o seu pai?
- você não tem bundinha no queixo.
- [ela deita a torrada no prato e passa a mão no queixo] é verdade, eu não tenho bundinha.
- [ele aponta para o dele.] e eu tenho.
- bundinha. você já disse isso, meu filho.
- o papai não tem.
- é verdade.
- ele não tem uma bundinha no queixo como a minha.
- [silêncio.]
- genes, mãe.
- genes?
- a bundinha do queixo está nos genes.
- genes.
- não nos seus. nem nos do papai.
- mas o seu pai tem um queixo lindo, meu filho.
- mas não tem bundinha.
- [ela olha para a TV e tenta ler os lábios da mariana godoy] o nariz dele...
- pelo amor de deus, mãe... não vamos desviar...
- bundinha. tá bem. o queixo do seu pai não tem um risco no meio.
- não tem bundinha mãe.
- não tem.
- não.
- é. [ela alcança o controle remoto e aumenta a televisão: flamengo 3, vasco 2.]

sexta-feira, dezembro 17, 2004

gente que freia de repente.

desde que o homem evoluiu e passou a andar ereto por aí, desenvolveu várias maneiras de andar. rápido. devagar. com os braços em constante movimento. com os braços quase parados. passos pequenos. passos longos. passos pequenos alternando com passos longos. existe uma infinidade de maneiras de andar. eu particularmente ando devagar. sou sempre ultrapassado pelas pessoas. se os seres humanos viessem ao mundo equipados com espelhinho retrovisor preso na testa, eu já estaria cego de tanto levar farol alto dos mais apressados. mas, como você pode ver pelo título deste textinho, gostaria de falar sobre gente que freia de repente. pessoas que nasceram com freios abs® na sola dos pés. você com certeza já deu um esbarrão num fêla da puta desses. acontece muito em shoppings. acontece também em aeroportos e em ruas movimentadas. gente que freia de repente tem um sério problema em manter uma velocidade constante. esse pessoal acelera, e, quando você menos espera, pára. de 15 km/h para 0 km/h. e você, o babaca que está atrás sempre bate. e, assim como no trânsito, quem bate atrás é sempre o culpado. bati de resvalão num terno armani hoje na hora do almoço. o babaca me ultrapassou no meio da subida da escada rolante. só que, quando eu já achava que ele estava bem longe, na casa do caralho-- ele freiou. foi sair da escada rolante que ele freiou. de repente. como se num milésimo de segundo não sabia mais quem era ou o que estava fazendo alí. na minha frente. se fudeu. além do resvalão no terno, bati feio no sapato dele. e pela cara do sujeito-- o sapato é zero km. e melhor, pelo impacto-- foi perda total. gente que freia de repente-- vai dar uma meia hora de bunda.

segunda-feira, dezembro 13, 2004

o teste da academia. parte 1.

quando você entra numa academia, você obrigatoriamente tem que fazer o teste físico. o teste físico é aquela bateria de mini-exames para determinar o seu tipo, a sua série de musculação e principalmente para humilhar. é. porque a primeira coisa que pedem pra você fazer ao entrar na sala de exame é tirar a camisa. mostrar os pneus. a pança e as dobrinhas. inventaram um instrumento feito sob medida pra deixar você com cara de bosta. é um alicate que mede o seu nível de gordura. de banha. a mulher que me atendeu hoje fez questão de me mostrar como o negócio funcionava. ela pegava a banha, prendia com o alicate e mostrava os números. depois do teste da banha, vem as pedaladas. ela manda você padalar com uma intensidade que varia: ela aumenta quando você está tranquilo e só pára quando você ameaça tossir sangue. mas zuzo bem, eu não desmaiei. em seguida (vale lembrar que eu ainda estava sem camisa) deitei no chão gelado e tive que fazer o maior número possível de abdominais em 60 segundo. na terceira abdominal, vi tudo preto e larguei a cabeça contra o concreto. abri um sorriso para disfarçar a dor. da abdominal para a flexão de braço. consegui completar 8. meus braços não respondiam mais os estímulos que meu cérebro mandava. eles siimplesmente tremiam. sentado numa cadeira daquelas de couro sintético, sentia minhas costas grudando-- e suor acumulando na base do pescoço. por alguns segundos pensei em abandonar essa sociedade que dá valor a pessoas que cabem dentro de suas respectivas calças jeans e criar a sociedade alternativa: a sociedade da calça de moletom.

o ladrão.

acho que esse fim de semana passou mais rápido que todos os outros.
hoje, a caminho do trabalho, pensei em parar numa delegacia e fazer um boletim de ocorrência.

delegado (confuso): "você pode ser mais claro? como assim, roubaram seu fim de semana?"
eu: "é, roubaram. saí do trabalho na sexta-feira--relativamente cedo. e quando me dei conta já era segunda--e estava drigindo de volta para lá..."
delegado (interrompendo): "de volta para o trabalho?"
eu: "é."
delegado: "você se lembra se foi atacado?"
eu: "acho que sim."
delegado: "será que você conseguiria descrever quem roubou seu fim de semana?"
eu: "não sei--como eu disse--foi tudo muito rápido."
delegado (ficando puto): "você me desculpe, mas é a primeira vez que eu escuto isso.
acho que estamos perdendo tempo aqui. tenho coisa mais importante pra fazer."
eu (assustado): "que horas são?"
delegado(puto): "porque?"
eu: "acho que o filha da puta atacou de novo. roubou a nossa manhã."

sexta-feira, dezembro 03, 2004

17 minutos.

hoje cedo, quando a porra do alarme tocou, eu tive uma idéia. ainda não sei ao certo se é uma boa idéia. mas não deixa de ser uma idéia. é. enquanto o alarme gritava "levanta moleque! levanta porra! seu bosta.... preguiçoso!", fiquei rolando na cama pensando no que poderia ser feito para acabar de vez com aquela sensação escrota de todas as manhãs. a primeira idéia que me veio à cabeça, foi-- a de realizar um congresso é, um congresso de grandes proporções. reunir formadores de opiniões. celebridades. estudantes barulhentos. atores, atrizes, diretores de cinema b, taxistas e motoristas de ônibus. todos no mesmo lugar. a idéia do congresso é simples: convencer o mundo inteiro a ficar na cama por mais 17 minutos. todo mundo esparramado na cama por mais 17 minutos todos os dias. na minha opinião, esse é o tempo necessário para tirar o gosto de travesseiro e cobertor da boca. 17 minutos equivalem a umas 4 apertadas do botão de 'soneca' do alarme. e dependendo do alarme, umas cinco apertadas do botão de 'soneca'. ou seja, é tempo suficiente para rolar adoidado na cama e levantar de bom humor. tirar a remela dos olhos. toda remela, até aquela que fica agarrada entre o canto dos olhos e o começo do nariz. é tempo para bocejar até estalar as mandíbulas. acordar com disposição. e cheio de vontade de encarar um belo trânsito de segunda-feira. esse congresso poderia significar a tão esperada paz no mundo. o fim da violência. dos crimes. é. com 17 minutos a mais de sono na cama-- todo mundo teria mais saco para tudo. muito mais saco. as pessoas seriam mais felizes. 17 minutos que podem mudar o mundo. mas é claro, para que essa idéia funcionasse, todas as pessoas, sem exceção-- teriam que concordar com os termos. o primeiro fêla da puta que levantasse da cama, um minuto mais cedo-- fuderia com o esquema de todo mundo. hoje cedo, quando a porra do alarme tocou, eu tive uma idéia: 17 minutos a mais na cama.